sexta-feira, 14 de abril de 2017

Rui: peixeiro, vendedor de loterias, empregado de balcão. Aleijado.

Delfina Rosa era uma espécie de varina. Mas daquelas que não vendem peixe. Era da Costa e trabalhou no Carolina do Norte. Era assim de um estilo, quase português. Dava esmola aos pobrezinhos e ficava anos sem falar com os filhos, à vez. Era as tricas das intrigas. Teve cinco filhos. Quatro do primeiro casamento. E o outro, o mais novo, do segundo. O segundo marido, garçon típico de um conhecido restaurante usava, em quase português, calças pretas plissadas e camisa branca de servir. Gostava de ir às putas. Uma vez, uma delas fez-lhe a desdita e roubou-lhe a carteira.

O primeiro marido, coxo, não tinha uma perna. Uma carroça passou-lhe por cima quando criança. Vendia loterias. Os filhos eram o Carlos Alberto, o Zé Luís, o Eduardo, a Lurdes e o João (este, do punheteiro). Todos passaram pela emigração, sem excepção. O Carlos e a Lurdes não lá ficaram.
O Carlos era engraxate no Rossio e fugiu para a Suiça para não ir à tropa. Costumava dizer que era um zero. Mas um zero à esquerda. Ia, com naturalidade (?), ao Miguel Bombarda. Até à data de nove do nove do nove. Altura em que uma corda com o nó de enforcado acabou com ele ali no Bairro da Meia Laranja, o outro, o novo, da Avenida de Ceuta (não me lembro o nome). O Zé Luís, em quase português, um charlatão, invisível, mas um invisível à mafioso. Vida na Holanda e casa forrada a espelhos na Cruz de Pau. Teve uma filha com poliomielite (como a Frida). O Eduardo, companheiro de infância e de desventuras de Lurdes fez-se a monte aos dezoito com meia dúzia de escudos nos bolsos. Sofre agora de uma crise de meia-idade (usemos este eufemismo, por favor). Tem casado com mulheres muito jovens de nacionalidades exóticas e distantes. Assim, tipo, "apaixonadamente". A Lurdes, nascida em casa, em quase português, na Vila Nova da Caparica, a mais nova (sem contar com o bastardo) e a única mulher fugia à sina do, - quase português. Tentou a sua sorte na Holanda, mas levava na barriga um filho e achou que abortos, naquele contexto não lhe serviam. Acreditava que nem tudo o que passava na televisão era verdade e que não se devia confiar, nunca, em homens bonitos. Desenhava bastante bem. O João, o caçulo, usava kispos grandes, que um português tem sempre frio. E os pachás também.

Delfina Rosa, em quase português, era beata e dava esmolas aos pobres. Os filhos diziam sempre que ela se tinha separado do pai deles porque este era um aleijado. Só por isso. 

Quando ficou viúva, enojou, claro. Em quase português, não despiu o luto. Foi morar para a terra do marido, Santa Margarida. Assim ficava bem protegida pelos militares.


Eram todos, em estilo quase português, de uma beleza quase [rara-proto-estrangeira].
Agora são quatro, cada um luta por se manter quase português, assim
apenas [vivos]!  

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

perdi alguém pelo caminho
estou sempre a perder coisas.

não. mentira 11
Não, os touros não são pretos
por serem pintados com tinta.

mentira 10
- "O que é esta pequena fracção de tempo, - do sofrimento,
quando temos a vida toda pela frente?
Tanta vida?"

mentira 9
o sul subiu.

mentira 8
a segurança social é uma cabra
não, não é
as cabras são lindas
e dão grandes saltos
(além disso, marram
coisa muito útil nos dias de hoje).

mentira 7



(...) "E anti-naturalmente
Passearmos de mão dada
Os nossos belos corpos nus
na areia grossa da praia". (...)

mentira 6